1. Carta da Plataforma:
Para: Pedro Mota Soares
Mensagem:
Cara(o) Deputada(o)Como já é do seu conhecimento, somos um grupo de cidadãos e de várias associações diversas, organizados na Plataforma Não ao Tratado Transatlântico e ligados à Plataforma europeia, STOP TTIP, que reúne mais de 500 organizações europeias.
No dia 21/03/2017 enviámos-lhe um email pedindo-lhe que clarificasse a sua posição a respeito do Acordo Económico e Comercial Global (CETA) – aprovado pelo Parlamento Europeu, no passado dia 15 de Fevereiro, que carece ainda de ratificação após aprovação na Assembleia da República – respondendo a um conjunto de questões sobre esta matéria.
A 29/03/2017, enviámos um lembrete daquele pedido e continuámos sem receber qualquer resposta, quer clarificando a sua posição no que diz respeito às questões colocadas, quer justificando a impossibilidade de o fazer.
Enquanto cidadãos que o sra.(sr.) deputada(o) deve representar, lamentamos profundamente esta situação.
Atendendo à aproximação desta votação, solicitamos, pela terceira vez, a resposta às questões colocadas no questionário que se encontra em https://goo.gl/forms/0NbIgkAIDQ37zbOs1.
Informamos que as respostas serão disponibilizadas no nosso website (https://www.nao-ao-ttip.pt/ ), podendo ser consultadas por qualquer cidadão, em particular aqueles que estão directa ou indirectamente associados à nossa Plataforma. Será destacada a ausência de resposta após 10 dias úteis desta terceira tentativa de contacto.
Damos conhecimento, ainda, da existência do documento “CETA em Revista”, da nossa autoria, disponível em http://tinyurl.com/revista-ceta que expõe de forma clara os impactos que o CETA terá para os países envolvidos, com particular destaque para Portugal.
Facultamos ainda os links dos dois pareceres que nos foram solicitados pela Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, entregues no dia 22 de Junho do corrente ano, referentes à Proposta de Resolução n.º 49/XIII/2.ª – “Aprova o Acordo Económico e Comercial Global entre a União Europeia e os Estados-Membros, por um lado, e o Canadá, por outro, assinado em 30 de outubro de 2016” (1) e à Proposta de Resolução n.º 50/XIII/2.ª – “Aprova o Acordo de Parceria Estratégica entre o Canadá, por um lado, e a União Europeia e os Estados-Membros, por outro, assinado em 30 de outubro de 2016” (2).
Aguardando resposta,
Saudações cidadãs
Plataforma Não ao Tratado Transatlântico
(1) https://tinyurl.com/parecer49
(2) https://tinyurl.com/parecer50[1] 408 contra 254 votos e 33 abstenções.
2. A resposta que recebemos do deputado Pedro Mota Soares
(enviada pelo assessor dele João Vaz Tomé):
Exmos./as Senhores/as,
Encarrega-me o Senhor Deputado Pedro Mota Soares de, em resposta à mensagem em epígrafe, informar a Plataforma Não ao Tratado Transatlântico do seguinte:
A agenda comercial que a União Europeia tem em curso será um impulso decisivo ao reforço da internacionalização das nossas economias. É particularmente relevante neste contexto o acordo comercial e de livre-comércio com o Canadá – CETA -, bem como as negociações com os Estados Unidos da América, com o Japão e com a China, mas também com os parceiros do Mediterrâneo e com os países da ASEAN.
A crise económica e financeira colocou ao projeto europeu sucessivos desafios, que a Europa tem conseguido ultrapassar com assinalável capacidade de adaptação, umas vezes melhor, outras vezes pior, e que os Estados-membros, principalmente Portugal, devem continuar a apoiar e promover.
É por isso necessário que, nos seus debates internos, os Estados-membros promovam uma discussão esclarecedora e construtiva sobre a política europeia, combatendo as tendências para o populismo e o euroceticismo que se vêm registando de forma crescente.
Todos nos lembramos que acordo comercial entre a UE e o Canadá esteve muito perto de bloquear, de ruir, ou até de se desfazer, há poucos meses. Felizmente, a Europa não se rendeu às forças populistas, protecionistas, anti-globalização e anti-economia de mercado, soube, pelo contrário, reconhecer a importância desta acordo de livre-comércio como força agregadora de dois blocos que partilham valores, afinidades e características comuns. Aliás, se a UE não se entendesse com o Canadá, dificilmente se entenderia com um outro qualquer país para firmar um acordo desta natureza e dimensão.
A parceria entre a UE e o Canadá afigura-se como indispensável não só para assegurar a retoma do crescimento num contexto de competição crescente e intensa com as economias emergentes como para definir padrões globais de comércio e regulação mais próximos dos padrões das democracias destes dois blocos.
O CETA é, por isso, um acordo entre parceiros que partilham valores comuns, como é o primeiro acordo que a UE assina com um parceiro do G8. E temos poucas dúvidas de que constituirá, um precedente e um exemplo para futuros acordos da UE; e, mais, como novo modelo de referência do comércio internacional.
Não exageramos no entusiasmo que fazemos das estimativas dos estudos sobre o impacto do CETA, mas também não os ignoramos: com este acordo, espera-se um reforço do comércio internacional entre a UE e o Canadá crescimento do PIB na ordem dos 12 mil milhões de euros.
Na perspectiva das nossas preocupações, víamos como muito crítico, no início das negociações, a participação das províncias e territórios, a questão do investimento (pela existência do Investment Canada Act), as indicações geográficas e a forma como o Canadá estaria disponível para assegurar a protecção das nossas indicações geográficas), mas também o tema das regras de origem, que já foi referido pelas características que a economia canadiana tem.
Conseguimos superar isso. E o CETA é, no nosso entender, um bom acordo, porque prevê o desmantelamento pautal, prevê as barreiras não-pautais, prevê, pela primeira vez, uma vinculação das províncias e territórios, isto significa que há condições de concorrência equitativa para os operadores da União Europeia no Canadá face aos operadores NAFTA.
Mantemos a convicção de que este acordo poderá representar um importante passo para o nosso crescimento económico.
Para Portugal, um acordo comercial que coloque o atlântico no centro do comércio internacional potenciará sempre o nosso país como pivot geopolítico deste espaço geográfico. E o CDS-PP, fiel ao seu ADN atlantista, considera que este acordo confere, de facto, uma nova centralidade ao nosso país. Aliás, o CDS-PP, apresentou-se em coligação com o PSD, em 2015, defendendo expressamente, tal como consta do Programa Eleitoral da PAF – Agora Portugal Pode Mais -, na página 146 do documento: “O lugar no mundo da UE passa, também, pelo estabelecimento e aprofundamento de parcerias estratégicas com potências emergentes, como é o caso do Brasil, e na concretização de acordos de livre comércio, que compatibilizem um acesso tão alargado quanto possível a novos mercados, com o respeito pelo selo de origem dos nossos produtos”.
Apesar das actuais relações entre Portugal e o Canadá não serem muito significativas, representando apenas 0,8% das nossas exportações, julgamos que o Canadá constitui um mercado muito significativo – mais de 30 milhões de habitantes – para os nossos produtos tradicionais agroalimentares mas também para os produtos tradicionais industriais. Nesse sentido, consideramos que as nossas exportações possam vir seguramente a aumentar e que as 1380 empresas que actualmente exportam para o Canadá terão um acesso muito felicitado.
A representação nacional nesse Comité dos diferentes EM foi assegurada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, e em particular pela Direcção-Geral dos Assuntos Europeus. E essa representação foi, naturalmente, preparada em coordenação com todos os Ministérios sectoriais.
A Direcção-Geral de Assuntos Europeus teve características de organismo de coordenação, reunindo contributos, sensibilidades e as análises elaboradas pelos diferentes Ministérios (neste caso foi particularmente relevante os contributos apresentados pelo Ministério da Economia e Ministério da Agricultura), ficando encarregues de fazer a avaliação global e apresentar a posição nacional.
O CDS partilha, tal como o Governo, do entendimento de que este acordo, dada a sua natureza mista a que a Comissão Europeia tanto resistiu em reconhecer, inclui matérias que são da competência nacional, ou seja, não estão inteiramente comunitarizadas, como os transportes ou investimentos de portfólio. E nesse sentido, o reconhecimento desse facto exige, obviamente, a ratificação, não só do Parlamento Europeu (que ocorreu no passado dia 17 de março), mas dos parlamentos nacionais. Mas convém também dizer que exigiu unanimidade na aprovação pelo Conselho, e não apenas maioria qualificada.
Relativamente à questão da transparência, ouvimos, em 2014, como ouvimos na passada audição, no dia 23 de Março, com a Comissária Malmstrom, a afirmar que o acordo começou a ser negociado em 2009, mas nessa altura a exigência que se colocava ao processo de negociação não era tão rígida como aquela que depois foi aplicada ao TTIP. A Comissária reconheceu isso. Mas importa dizer que ainda assim não há nenhum país que tenha uma política comercial tão aberta e tão transparente como a UE. E não há nenhum acordo comercial anterior ao CETA que tenha sido tão aberto e transparente na UE, talvez com a excepção do TTIP, nem na matéria da informação disponível, do acompanhamento parlamentar ou do acompanhamento da opinião pública.
Sobre a entrada provisória do acordo, importa destacar a natureza democrática do processo de decisão. Quem decidiu não foi a Comissão Europeia – a Comissão Europeia negociou, devidamente mandatada pelo Conselho –, o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu aprovaram[1] e ratificaram respectivamente. Mais, o que entra em vigor provisoriamente é a parte relativa à competência exclusiva da UE. Só entrará plenamente em vigor quando os parlamentos de todos os EM o ratificarem (38 câmaras).
O que entra em vigor é a parte do Acordo relativa à competência exclusiva da UE. Esta é uma decisão que emana do Conselho, onde se encontram representados os EM; e contou com a concordância do Parlamento Europeu. Porque isso está previsto nos Tratados e sempre assim foi.
Ao nível europeu, foram mais de 18 debates que tiveram lugar no Parlamento Europeu sobre o CETA. Para além disso, a Comissão garantiu que existissem locais de leitura em todas as capitais europeias – isso foi dito pela Comissária Europeia na passada audição. Desde o início das negociações, reiterar que houve consultas, por parte do anterior como do actual Governo, aos parceiros sociais, a associações profissionais, a associações sectoriais, que tiveram a oportunidade de participar no debate público em Portugal mas também ao nível europeu (reuniões com as instituições europeias). Foram organizados 3 debates: um em Lisboa, outro no Porto e outro, em Leiria, no sentido de promover o debate com os vários partidos políticos mas também com parceiros sociais, eurodeputados e com as organizações da sociedade civil, para que haja um debate ainda mais aprofundado. O Deputado Pedro Mota Soares teve a oportunidade de participar no debate em Leiria, no dia 11 de Abril.
Importa destacar, ainda no domínio das consultas públicas, que na Assembleia da República, o CETA foi discutido inúmeras vezes: audição com o então Presidente da Comissão do Comércio Internacional do Parlamento Europeu, o Prof. Dr. Vital Moreira (2013); conferência de apresentação do CETA, organizada pela CAE, que contou com a presença do Embaixador do Canadá junto da UE e a Subdirectora-geral dos Assuntos Europeus, Maria João Silveira Botelho (2014); três debates em plenário no decurso desta legislatura (2016/2017); audição com a Comissária europeia para o Comércio Externa, Cecilia Malmstrom (2017); audição com o Enviado Especial do Canadá para o CETA, Pierre Pettigrew (2017).
Nos contactos que o CDS manteve, ao longo deste processo, com associações empresariais, com os parceiros sociais mas também com várias entidades supramencionadas concluiu que o CETA será, de facto, uma oportunidade para as empresas e para os empresários portugueses.
Obrigado pelo contacto.
Com os melhores cumprimentos,João Vaz Tomé
Assessor
Grupo Parlamentar do CDS-PP
3. A resposta da Plataforma:
Boa tarde,
em primeiro lugar agradecemos a extensiva resposta. Lamentamos porém, que não tenha sido dada qualquer resposta às perguntas muito concretas que colocamos ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, tendo sido optado por responder através de afirmações gerais e apenas direccionadas para o enquadramento do CETA e para as suas alegadas vantagens.
Sendo a definição de “padrões globais de comércio e regulação” muito desejável, não basta afirmar repetidamente que o CETA é “um acordo entre parceiros que partilham valores comuns”. A consubstanciação desses valores é, em muitos pontos, cultural e historicamente diversa, como evidencia o princípio da precaução, que estabelece que o ónus da prova se encontra do lado de quem pretende praticar o acto ou acção que pode vir a causar o eventual dano -, um princípio basilar europeu, inverso ao princípio canadense da “prova (científica)”, a cargo de quem sofre os danos.
Em todo o texto da sua resposta, a esperança de que o CETA venha a ser vantajoso para Portugal, não passa disso, de uma esperança. Ora, um acordo que encerra tantas e tão substanciais implicações para a vida dos cidadãos, tem obrigatoriamente de se fundamentar em mais do que esperanças subjectivas; são precisos factos, neste caso, um estudo de impacto do CETA em Portugal. Atirar com números globais como “12 mil milhões de euros” não faculta qualquer informação concreta em relação ao que isso significa no caso de Portugal. Certo é que o CETA aumentou as taxas de importação de suínos do Canadá, quando Portugal já tem uma produção excedentária de suínos. Para já não falar no absurdo ambiental que é transportar suínos do Canadá para a Europa e vendê-los ainda mais barato do que a produção local.
Finalmente, e para abreviar, a Comissão só cedeu a determinados aspectos que refere na sua resposta (como a natureza mista do acordo) por efeito de uma forte pressão dos cidadãos e, por via deles, de certos governos, como foi o caso do alemão. Foi com um explícito mau humor que o presidente Juncker se submeteu a essa exigência, acrescentando, no momento, que, de futuro, os estados-membros terão que definir a priori se um acordo é misto e em que pontos. O papel do movimento de cidadãos nas negociações foi decisivo. Mas a exigência de transparência, tantas vezes prometida, continua a ser ignorada, como provam as negociações em curso do JEFTA, o acordo com o Japão.
Lamentamos imensamente que um acordo desta dimensão e alcance – em especial quanto à criação de um tribunal exclusivo para proteger os interesses dos investidores contra os estados – venha a ser aprovado na AR sendo praticamente desconhecido dos portugueses. Estamos pois muito longe de viver uma democracia sólida e esclarecida, como deveria ser o objectivo dos partidos representados na AR, sejam eles de direita ou de esquerda.
Com as melhores saudações,
Ana Moreno e Conceição Alpiarça