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Estudo: Acordo UE-Mercosul: Impactos e Propostas para o Sector do Milho

Estudo: Acordo UE-Mercosul: Impactos e Propostas para o Sector do Milho

Estudo: Acordo UE-Mercosul: Impactos e Propostas para o Sector do Milho

Os protestos dos agricultores europeus contra o acordo UE-Mercosul têm sido frequentes e bem visíveis. De facto, é sabido que o sector agrícola europeu vai sofrer impactos fortemente negativos deste acordo obsoleto, que a UE e os países do Mercosul, em especial o Brasil, obstinadamente querem finalizar. Esses impactos poderão ser de tal ordem, que a UE já sinalizou que iria criar um fundo para indeminizar os agricultores afectados. Ao que alguns responderam: Precisamos de preços justos, não de novas ajudas compensatórias […] Os nossos agricultores não são variáveis de ajuste para serem comprados ou vendidos”.

O estudo “Acordo UE-Mercosul: Impactos e Propostas para o Sector do Milho – Para uma União Europeia mais coerente e agricultores mais protegidos” elaborado e recentemente divulgado pela Confederação Europeia de Produtores de Milho (CEPM), vem mais uma vez comprovar a profunda incoerência entre as políticas de sustentabilidade e as políticas comerciais da EU, com consequências muito nefastas, neste caso, para os agricultores europeus, para a saúde dos consumidores e para a soberania alimentar.

A ANPROMIS – Associação Nacional dos produtores de Milho e Sorgo, divulga este estudo no seu site, referindo que “Com este Estudo, pretende-se alertar os Cidadãos e os Dirigentes dos diferentes Estados-membros para o perigo deste acordo, sobretudo se não forem exigidas as mesmas obrigações de produção aos agricultores do Mercosul e da União Europeia”.  E como principais resultados deste estudo, destaca:
– A União Europeia é o principal importador de milho, à frente da China;
– Em 2022/2023, a União Europeia voltará a ser o maior importador de milho, adquirindo 26 milhões de toneladas;
– Um milhão de hectares de milho foram perdidos ao longo do últimos vinte anos no espaço europeu;
– Um em cada quatro toneladas de milho consumidas na UE é agora produzida em outras partes do mundo;
– 52% das substâncias activas autorizadas no Brasil são proibidas na UE!
– No total, das 178 substâncias activas autorizadas para utilização no milho no Brasil e na Argentina, 92 estão proibidas na Europa porque são consideradas de risco para a saúde e para o meio ambiente. O exemplo da atrazina é paradigmático. A atrazina é um herbicida prejudicial para humanos e tóxico para o meio ambiente devido à sua presença na água e ambientes aquáticos, está proibido desde 2007 a nível europeu e é ainda hoje utilizado no Brasil.

A TROCA considera importante reproduzir as propostas que no estudo são apresentadas como soluções, as quais traduzimos e seguidamente transcrevemos:

“AS NOSSAS 5 SOLUÇÕES

Rejeitando estas incoerências, os produtores europeus de milho, unidos na CEPM, propuseram 5 soluções no seu estudo para alinhar a política comercial da UE com os seus objectivos em termos de soberania e sustentabilidade, nomeadamente com o Pacto Ecológico Europeu:

SOLUÇÃO N°1

Alteração profunda do acordo de comércio livre entre a UE e o Mercosul para incluir “cláusulas-espelho” que condicionem qualquer preferência comercial concedida ao milho ou a produtos derivados do milho à não utilização de substâncias activas proibidas na Europa por representarem um risco para a saúde humana e/ou o ambiente. 

SOLUÇÃO N°2

Adoptar “medidas-espelho” no âmbito da legislação sectorial europeia, tal como autorizado pelas regras da OMC, destinadas a proibir as importações de milho ou de produtos derivados do milho tratados com substâncias activas proibidas na UE e consideradas as mais tóxicas (atrazina, etc.). 

SOLUÇÃO N°3

Impor a estruturação de sectores dedicados às exportações para a UE nos principais países exportadores de milho, inspirados nos precedentes existentes no sector da pecuária (proibição da carne de bovino tratada com hormonas, em vigor desde 1988). Estes sectores terão de garantir que as substâncias activas proibidas não são utilizadas em nenhuma fase da produção agrícola e de efetuar controlos das normas de produção nos países exportadores – que não se limitariam aos controlos dos “limites máximos de resíduos” do milho importado. 

SOLUÇÃO N.º 4

Acrescentar as zonas de savana do Cerrado à lista de ecossistemas abrangidos pelo regulamento europeu relativo aos produtos não provenientes da desflorestação.

SOLUÇÃO N.º 5

Renovar o mecanismo dos direitos aduaneiros aplicáveis ao milho para proteger eficazmente a capacidade de produção europeia e apoiar os esforços dos agricultores europeus no sentido da transição ecológica.

Salientamos ainda as seguintes passagens do estudo:

Algumas explorações agrícolas em Mato Grosso chegam a ter 500.000 hectares – o dobro do tamanho do Luxemburgo! 

Estas “agro-holdings” de Mato Grosso, que cultivam milho “safrinha” na época baixa, após a colheita da soja, em terras geralmente desflorestadas, contrastam fortemente com a produção de milho na União Europeia. Em primeiro lugar, em termos de dimensão: as maiores explorações exportadoras cobrem até 500 000 hectares, o dobro do Luxemburgo! Em segundo lugar, pelas suas práticas: a quase totalidade do milho aí plantado é organismo geneticamente modificado (OGM) e os produtores recorrem maciçamente a produtos fitossanitários à base de substâncias activas estritamente proibidas na Europa, por vezes, há muitos anos. 

É uma aposta perdida para a Comissão Europeia, que está a perder em todas as frentes, da soberania alimentar à transição ecológica.

A UE está a fazer uma aposta estranha, porque ao deixar sistematicamente para trás esta questão central das normas de produção dos produtos alimentares e agrícolas que importa – e do seu impacto na saúde e no ambiente – está a perder em todas as frentes. 

Da atrazina aos neonicotinóides: 52% das substâncias activas autorizadas no Brasil para os produtores do Mercosul são proibidas na UE!

No total, das 178 substâncias activas autorizadas para utilização no milho no Brasil e na Argentina, 92 são proibidas na Europa por serem consideradas perigosas para a saúde ou para o ambiente. Por outras palavras, 52% das substâncias activas autorizadas para os produtores do Mercosul que exportam o seu milho para a União Europeia são proibidas na UE! Esta proporção é ainda mais elevada em alguns Estados-Membros, como a França: 138 das 178 substâncias activas autorizadas no Brasil e na Argentina são proibidas em França (77,5%). 

É o caso, por exemplo, da atrazina: um herbicida nocivo para os seres humanos e tóxico para o ambiente devido à sua presença na água e nos meios aquáticos, proibido desde 2007 a nível europeu. Esta proibição, que está em vigor há quase vinte anos, não impediu a União Europeia de abrir o seu mercado ao milho importado – do Brasil, por exemplo – que é deservado com atrazina. 

Outro exemplo: os neonicotinóides. Estes insecticidas, proibidos na União Europeia, são utilizados habitualmente pelos produtores de milho do Mercosul. Também neste caso, a abordagem “longe da vista, longe do coração” da Comissão Europeia não parece suscetível de pôr em causa as numerosas saídas comerciais oferecidas no mercado europeu aos principais produtores de milho do mundo.”

Em resumo, os desafios e oportunidades do acordo seriam:

  • Concorrência internacional: A entrada de milho produzido fora da UE a preços mais competitivos.
  • Sustentabilidade ambiental: Diferenças nos padrões de produção entre os países do Mercosul e da UE.
  • Propostas de mitigação: Medidas sugeridas para proteger o setor agrícola europeu.

 

O acordo UE-Mercosul é um lamentável exemplo da falta de coerência entre as políticas europeias, retirando-lhes a credibilidade, ao mesmo tempo que, em nome de um crescimento económico residual, ameaça o futuro das pessoas e do Planeta.