ICS
Reformulação do ISDS com ligeiras melhorias processuais.
O Sistema de Tribunal de Investimento (conhecido pela sigla ICS que vem do inglês “Investment Court System”) consta do Acordo Económico e Comercial Global entre a UE e o Canadá (CETA), e é apresentado pelos seus proponentes como sendo um mecanismo de protecção do investimento diferente dos mecanismos de arbitragem usuais (ISDS), dando resposta às preocupações dos críticos e às insuficiências destes sistemas. A UE tem proposto este sistema em outros Tratados de Comércio e Investimento que está a negociar.
Diferenças entre ICS e ISDS
Efectivamente, no ICS os árbitros não são pagos «ao caso», o que poderia constituir um incentivo para deliberações em favor do queixoso (para incentivar a litigação) e os processos são públicos (o que é uma melhoria face ao inaceitável secretismo que domina os sistemas ISDS). Além disso, os graves problemas de conflitos de interesse são algo atenuados pelo carácter permanente da função de árbitro.
No entanto, as semelhanças entre os sistemas são de tal forma mais relevantes que as diferenças, que é comum afirmar-se que o ICS é o ISDS com uma maquilhagem diferente.
A este respeito várias associações da sociedade civil (Canadian Centre for Policy Alternatives, Corporate Europe Observatory, Friends of the Earth Europe, Forum Umwelt und Entwicklung e Transnational Institute) elaboraram um relatório onde fazem as seguintes considerações:
- O ICS não é um tribunal: é baseado num modelo de arbitragem. Salvaguardas fundamentais para assegurar um sistema legal independente continuam ausentes.
- O ICS mantém um tratamento preferencial face a investidores externos sem obrigações relativas ao cumprimento de legislação ambiental, social, destinada a proteger a saúde e segurança públicas, ou outros padrões regulatórios.
- Os investidores externos continuam a poder contornar os tribunais nacionais para processar os estados através do ICS, o que logo à partida constitui uma discriminação face aos investidores nacionais.
- O ICS mantém protecções excessivas para os investidores, incluindo o direito a alegar “expropriação indirecta” (lucros inferiores às expectativas) como resultado de nova legislação feita em nome do interesse público. (…)
- O ICS não garante quaisquer direitos ao público ou a qualquer pessoa ou entidade lesada pela acção de investimento. Cidadãos que sofram danos como resultado da actividade de empresas multinacionais (…) não podem recorrer a tribunais internacionais.
- O ICS não protege o direito de regular. A ambiguidade do texto deixa aos árbitros a responsabilidade de interpretar que medidas governamentais são “necessárias” para atingir objectivos “legítimos”.
- O ICS mantém o potencial para que exista um “efeito intimidador” sobre a legislação (…)
ICS e ISDS: os mesmos resultados práticos
O relatório em causa analisa cinco casos ISDS muitíssimo polémicos (Philip Morris vs Uruguai; TransCanada vs the EUA; Lone Pine vs Canadá; Vattenfall vs Alemanha I; Bilcon vs Canadá) e conclui que o ICS manteria o potencial para litigação em qualquer destes casos, bem como os riscos e incertezas associados.
O mecanismo ICS insere-se no âmbito de um acordo muitíssimo pernicioso para os cidadãos da União Europeia e do Canadá, mas não é garantida a sua compatibilidade com a legislação europeia, estando neste momento a decorrer uma acção no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que pode culminar com a ilegalização deste mecanismo.
A este respeito importa referir que a Comissão Europeia desejava implementar o mecanismo ICS apenas pela aprovação no Parlamento Europeu do CETA, sem que os Parlamentos Nacionais ratificassem esta decisão, tendo sido frustrada nesta intenção por uma decisão do TJUE. O mesmo TJUE veio numa decisão recente proteger a autonomia de direito da União de mecanismos de arbitragem constantes de acordos bilateriais de comércio e investimento que a procuram contornar, o que pode ser visto como um prenúncio positivo em relação ao seu pronunciamento quanto ao ICS.
O ICS não está em vigor, já que muitos estados da União Europeia ainda não ratificaram o CETA. Portugal ratificou o CETA em Dezembro de 2017.