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O projecto das 10.000 comunidades livres do TTIP

O projecto das 10.000 comunidades livres do TTIP

O projecto das 10.000 comunidades livres do TTIP

O TTIP, o CETA e o TISA terão graves impactos sobre a autonomia local. Em muitos municípios, os grupos da ATTAC e outros desenvolvem muitas actividades para levar as autoridades locais e o público a examinar criticamente estes acordos de desregulação. Neste website ( http://www.attac-netzwerk.de/) existe um esquema das actuais zonas livres do TTIP, tal como exemplos e outras ferramentas para alimentar o debate sobre o tratado em outros municípios.

A ATTAC também solicita às pessoas que informem sobre outras iniciativas e qual o sucesso obtido.

– Consequências do TTIP ao nível local:

As negociações entre os EUA e a UE sobre o TTIP não tratam principalmente do tráfego de mercadorias, mas sobretudo dos serviços em larga escala. Abrangidos estão não apenas os serviços oferecidos por empresas privadas que beneficiam os empresários e as firmas, mas também os Serviços Públicos. Na Alemanha, a maioria dos serviços públicos é da responsabilidade das autoridades locais. Ou estas estabelecem os serviços públicos por sua própria iniciativa ou colocam a sua gestão nas mãos de empresas privadas ou semi-privadas. As cidades e municípios devem preocupar-se com o TTIP por três ordens de razões:

1 – O TTIP terá um impacto evidente no tipo de serviços que serão estabelecidos de futuro pelas municipalidades e os que não o serão.

2 – As espécies de serviços a ser contratualizados através da competição e sob que condições, tudo isso dependerá da regulamentação que vier a ser adoptada pelo TTIP.

3 – A protecção dos investimentos levará à restrição da autonomia das autoridades locais, pois estas recearão incorrer em litígios / indemnizações.

– O TTIP representa o modelo a ser seguido em outras privatizações de municípios:

O Congresso Bávaro das Municipalidades reunido em Nov. de 2013 expressou graves preocupações sobre o facto de que, com o TTIP, a pressão privatizadora sobre as cidades e municípios irá aumentar. E porquê?

O TTIP é negociado com base nas listagens negativas que incluem, entre outros, os regulamentos destes serviços. Todos os serviços mencionados nas listas não serão abertos ao livre acesso dos mercados.

As listagens negativas têm duas partes. No attachment I listam-se as medidas já existentes que infringem o acordo futuro, mas que continuarão a ser permitidas. Todas as medidas não listadas mas que infringem o acordo serão abolidas.

O attachment II inclui tanto os regulamentos existentes como os futuros. Todos os serviços não incluídos nas listas terão de ser liberalizados.

No seu mandato negocial, os EUA definiram que muito poucos serviços públicos serão excluídos da liberalização (justiça, política, sistema penal…). A educação, a cultura, a água e o saneamento não serão excluídos.

Numa investigação pedida pela VKU (Associação das Empresas Municipais) concluiu-se que o tratado não autorizaria empresas públicas em regime de monopólio sobretudo no sector da água. Assim, a privatização do fornecimento de água volta a ser posta em cima da mesa pela porta do cavalo, apesar de ser um assunto que, no passado, foi sujeito a um alargado debate público na Alemanha e que o público recusou claramente.

– Obrigação de convidar empresas ou a financeirização das acções municipais:

Se uma municipalidade quiser renovar uma escola, esta não pode apenas olhar para o mercado e contratar uma firma para fazer a renovação, só porque se trata de uma empresa local, por trabalhar com processos amigos do ambiente, por apoiar clubes locais ou oferecer estágios. Os municípios serão obrigados a um processo de concurso e terão de contratar a firma que fizer um orçamento mais barato. Os outros aspectos sociais e ecológicos não poderão ser tidos em consideração. Para a renovação de uma escola isto talvez possa não ser crítico. Mas tal já será diferente no caso, por exemplo, de serviços culturais (teatro) ou educativos (educação de adultos, apoio escolar…) ou ainda de organizações que oferecem apoio e aconselhamento a jovens, apoio à habitação, etc. Também nesses casos terá de haver concurso público e o vencedor será quem oferecer preços mais baixos.

Muitos representantes de cidades e municípios receiam que esta obrigação de convidar as empresas irá abranger muito mais serviços públicos do que se esperava.

Se uma associação dirige um cinema local e recebe subsídios para isso por parte do município, este será forçado a convidar outras empresas para a tarefa e entregá-la a quem oferecer mais barato, sem ter em conta critérios sociais, locais, culturais ou outros. A aceitação repousa apenas em critérios económicos. Isto não é nada de novo. Há mais de 30 anos que se vem exigindo o economicismo das actividades municipais. Nas últimas décadas, a UE contribuiu consideravelmente para que esta tendência fosse transformada em directiva. O governo federal alemão e os governos regionais também deram um contributo decisivo nesse sentido, transformando a questão em lei limitativa das liberdades municipais de modo crescente.

Com o TTIP, esta tendência será reforçada consideravelmente. Mais grave ainda, tornar-se-á irreversível, uma vez que tudo o que for contratualizado e regulado no TTIP, já não poderá voltar atrás.

– Compre americano:

Na discussão sobre o TTIP, a Alemanha quer fazer passar a ideia de que este acordo é principalmente apontado aos grupos americanos interessados em penetrar no espaço europeu. O que não se diz é que os grupos localizados no espaço europeu têm o mesmo apetite em aceder ao grande mercado americano. O que faz a diferença são as indústrias e segmentos de mercado a que se dedicam. No caso concreto dos serviços municipais, o mercado americano é considerado mais forte politicamente e mais regulado e protegido contra a competição. Com o TTIP, os grupos de serviços europeus pretendem eliminar a regras do “compre americano” como padrão nos EUA. Esta, permite que às companhias americanas seja dada prioridade nos concursos públicos. Isto contraria as leis europeias.

– O TTIP e a protecção do investimento:

O tratado estabelece que os investidores estão protegidos contra a expropriação directa ou indirecta. Mas o que tem isso a ver com os municípios? Será que uma câmara pretenderá apropriar-se de uma agência local do Deutsche Bank? Clao que não. Contudo o acordo sobre a protecção dos investidores terá consequências sobre a liberdade dos municípios em termos políticos e práticos. Se, por exemplo, um município tornar as leis ambientais mais exigentes, uma firma que tenha trabalhado na zona e tenha tido grandes lucros com a lei antiga, poderá considerar isso uma expropriação indirecta. O seu capital perdeu rendibilidade devido aos novos padrões ambientais e pode levar o caso diante de um tribunal arbitral, exigindo uma indemnização por parte do município. Esses tribunais nada têm a ver com os tribunais normais onde os juízes de carreira aplicam as leis existentes. Trata-se de árbitros ad hoc que se reúnem para negociar acordos. Os que acham tudo isto impensável, devem recordar o caso Vattenfal contra a Alemanha em que a empresa exige 3,7 biliões (inicialmente eram 4,7) pelo facto de o governo alemão ter decidido encerrar as centrais nucleares de Kümmel e Brunhüttel. Este tipo de protecção ao investimento faz com que os municípios tenham de pensar muito bem sobre leis ambientais mais exigentes ou sobre normas de construção civil de baixo preço, com receio de serem obrigados a pagar altas indemnizações.

– Os activistas locais defendem-se:

Mesmo sendo secretas as negociações do TTIP e mesmo que o assunto pareça abstrato para muita gente, afastado da vida do dia a dia, a verdade é que as críticas a este tratado chegaram às cidades e aos municípios alemães.

O TTIP tornou-se já o tópico de discussão em muitas comissões municipais. Por exemplo, a assembleia da cidade de Erkrath adoptou a posição de exigir ao governo federal que se pronuncie contra o TTIP. Em outros casos, os municípios emitem declarações contra as consequências do TTIP. Até agora, isto parece ser um fenómeno periférico em vez de uma enorme vaga de protesto. Mas quando se espalha a informação pelas cidades e câmaras, mais provável se torna a possibilidade de cada vez mais actores municipais se oporem.

– O TTIP merce críticas por apoiar a predominância do livre-comércio e a monetarização de todas as áreas da vida social.

É reconfortante observar que cada vez mais pessoas e instituições actuam contra o TTIP e que a quebra das negociações se torna mais provável. Mas isto poderá ser apenas uma vitória de Pirro, se nos esquecermos que a paragem do TTIP também tem de ser a paragem do CETA e do TISA, desmascarando-os e à sua ideia de livre-comércio.

Até agora, as campanhas contra esses tratados ainda não conseguiram parar o caminho em direcção à monetarização de mais e mais áreas da vida (saúde, educação, cultura…). O processo continua a todos os níveis, municipal e outros. Todos aqueles que querem ter bons serviços públicos nas cidades e municípios têm de ser opor aos slogans neo-liberais que exigem “quanto mais mercado (capitalista) tanto melhor e com tanta competição quanto a necessária”.

ATTAC, Julho de 2015

Tradução de Verena Milbers e José Oliveira