O secretismo que envolve as negociações para a modernização do Tratado da Carta da Energia, que decorrem há dois anos sem grandes resultados, não só atenta contra o escrutínio democrático, como é extremamente lamentável face à enorme influência e perigo que este anacrónico tratado constitui para a transição energética. O TCE garante às grandes empresas energéticas que sejam os contribuintes a pagar indemnizações astronómicas, generosamente calculadas, por lucros futuros que possam deixar de vir a ter, devido a medidas tornadas necessárias à luz da crise climática.
Face a tal secretismo sobre o avanço das negociações, é uma oportunidade única – tendo em conta que a Comissão pretende encerrar as negociações em Junho próximo – a que se oferece no dia 24 de Março ao Parlamento Europeu (PE), onde poderá interpelar e ser informado pelo Conselho da União Europeia (UE) sobre a situação actual do processo de modernização e proceder a um debate público a esse respeito. Nessa ocasião, o PE irá colocar as seguintes questões:
- Quais são as principais prioridades dos Estados-Membros no processo de modernização do Tratado da Carta da Energia (TCE)? De que forma é que a atual crise energética afeta a posição negocial da UE?
- Como é que, em consonância com os Tratados, o Conselho e a Comissão mantêm o Parlamento e as suas comissões competentes imediata e plenamente informados sobre o andamento das negociações do TCE e de que forma estão a garantir a transparência e o acesso aos documentos de negociação?
- Quais são as principais posições das partes contratantes sobre uma reforma da definição de atividades económicas? Poderá a posição negocial da UE continuar a permitir a proteção dos investimentos em atividades que causem danos significativos ao ambiente, tal como definido na taxonomia da UE? O que pensa o Conselho relativamente à proposta de flexibilidade apresentada pelo Secretariado do TCE no tocante à definição de atividades económicas protegidas? Qual o ponto da situação das negociações sobre esta matéria?
- Que perspetivas prevê o Conselho para alcançar a unanimidade entre as partes contratantes do TCE sobre a exclusão dos investimentos em combustíveis fósseis da proteção do investimento? O que acontece se não houver acordo sobre a modernização do TCE até ao verão de 2022?
- Dado que a resolução de litígios entre investidores e o Estado não está sujeita a revisão no processo de modernização e, por conseguinte, não será substituída pelo sistema de tribunais de investimento, como pensa o Conselho velar por que um TCE modernizado esteja em conformidade com as condições estabelecidas pelo Tribunal de Justiça no seu Parecer 1/17?
- De que forma a modernização ou uma eventual retirada do TCE afetaria os mercados da energia, para além da cláusula de caducidade de 20 anos? Quais seriam o procedimento e os efeitos jurídicos e práticos de uma retirada? O Conselho e a Comissão estão a proceder a consultas sobre esta possibilidade? Tencionam o Conselho e a Comissão ponderar a hipótese de colaborar com países que partilhem as mesmas ideias para minimizar as consequências da cláusula de caducidade em caso de retirada?
Será, pois, um interessante debate que poderá lançar alguma luz sobre o posicionamento do Conselho da UE quanto a este obsoleto tratado que entrava a urgente transição energética e do qual, sem dúvida, uma saída conjunta dos estados membros da UE seria a opção mais adequada ao futuro do planeta.