A batalha sobre a proposta de mina de ouro na aldeia romena de Rosia Montana tem sido uma saga reminiscente de uma luta desigual, abrangendo mais de duas décadas. No seu cerne está a resiliência de uma comunidade contra os grandes interesses corporativos, preocupações ambientais e um sistema internacional de arbitragem enviesado.
Em 1999, a empresa canadiense Gabriel Resources obteve direitos de concessão para a área de Rosia Montana num projecto que previa a abertura de quatro pedreiras que iriam destruir quatro cumes de montanhas e eliminar três vilarejos periféricos que compõem o município. A comunidade local previu a devastação que aquele projecto traria à sua forma de vida, com casas demolidas e meios de subsistência destruídos, e desde então que resiste firmemente contra o estabelecimento do que seria a maior mina de ouro a céu aberto da Europa.
Apesar de enfrentarem imensa pressão da Gabriel Resources e de suportarem anos de batalhas judiciais, os habitantes de Rosia Montana conquistaram uma vitória significativa em 2014, quando um tribunal romeno decidiu a seu favor. O governo romeno, que possuía uma participação de 20% no projecto, retirou oficialmente seu apoio à mina, após meses de protestos em todo o país. E, em 2021, a UNESCO adicionou a antiga área de mineração de ouro romana de Rosia Montana, à sua lista de Sítios do Patrimônio Mundial protegidos.
No entanto, em 2015 a Gabriel Resources recorreu ao mecanismo de Resolução de Disputas entre Investidores e Estados (ISDS), um sistema de justiça paralelo exclusivamente disponível para multinacionais estrangeiras. Nesse processo ISDS, a Gabriel Resources reivindicava da Roménia pelo menos US$4,4 mil milhões (4.046.800.870,64 €) em compensação por supostos lucros perdidos.
O governo romeno, apesar de inicialmente temer uma decisão negativa, emergiu triunfante do julgamento de arbitragem. A vitória demonstrou a resiliência e determinação do povo de Rosia Montana na sua rejeição à exploração da terra e dos seus recursos, em benefício de ganhos corporativos.
Mas, em meio à celebração desta vitória tão conquistada, é crucial reconhecer as implicações mais amplas do caso. A saga de Rosia Montana sublinha o viés inaceitável inerente ao processo ISDS, através do qual os interesses das multinacionais podem contornar os tribunais nacionais e exigir compensações exorbitantes aos governos. Isso expõe o desproporcional poder que as empresas multinacionais exercem sobre estados soberanos, frequentemente à custa das comunidades locais e do meio ambiente. Além disso, as repercussões desta batalha levantam questões sobre os verdadeiros custos de tais empreendimentos. Os danos infligidos à vida e aos meios de subsistência do povo de Rosia Montana são incalculáveis. As cicatrizes da luta prolongada persistem, lembrando-nos do preço humano imposto por empreendimentos apenas orientados para o lucro, sejam quais forem os verdadeiros custos das suas actividades.
A disputa de Rosia Montana serve como alerta para a importância de proteger comunidades, preservar o património cultural e responsabilizar empresas pelas suas ações e empreendimentos. É um testemunho do poder do activismo de base e da resiliência daqueles que se atrevem a enfrentar a injustiça, mesmo perante dificuldades aparentemente insuperáveis.