No dia 13 de Março, a TROCA entregou em mão, no Ministério do Negócios Estrangeiros, cartas dirigidas ao Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, à Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Inês Domingos, e ao Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Nuno Sampaio, por não ter recebido resposta aos e-mails enviados àquele ministério no dia 20 de Janeiro do corrente.
Nos e-mails já se solicitava uma audiência para auscultar o posicionamento de Portugal no que concerne ao mecanismo de Resolução de Litígios Investidor-Estado (ISDS – Investor–State Dispute Settlement), incluído nos tratados bilaterais de investimento (BITs ‐ Bilateral Investment Treaties) celebrados entre o Estado português e 34 países diferentes.
A premência desta solicitação deve-se ao aproximar da data do termo de alguns destes BITs, nomeadamente os tratados com a Argentina e Kuwait, no próximo mês de Maio. Caso o governo não tome medidas, e de acordo com as respectivas cláusulas, corre-se o risco de alguns desses tratados serem renovados automaticamente e, deste modo, prolongada a garantia que o ISDS oferece aos investidores, assim como de se manterem todas as questões problemáticas que estes BITs acarretam, entre outras, os custos que o erário público terá de suportar.
De seguida publicamos, na íntegra, a carta entregue no MNE, dirigida tanto ao ministro como aos seus dois secretários.
Exmo. Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel,
Exma. Srª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Inês Domingos,
Exmo. Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Nuno Sampaio,
Data: 13 de Março de 2025
Assunto: Pedido de audiência sobre Tratados Bilaterais de Investimento e ISDS
Escrevemos-lhe com o propósito de solicitar uma reunião relativa ao posicionamento de Portugal no que concerne ao mecanismo de Resolução de Litígios Investidor-Estado (ISDS – Investor–State Dispute Settlement), incluído na maior parte dos tratados bilaterais de investimento (BITs ‐ Bilateral Investment Treaties).
É sabido que os BITs visam garantir a segurança jurídica dos investidores. Por outro lado, o mecanismo de resolução de litígios entre as partes através da arbitragem (ISDS) tem suscitado controvérsias e sido alvo de fortes críticas, por parte não só da sociedade civil, mas também de especialistas e políticos. A própria União Europeia abandonou o ISDS, passando a adoptar o ICS (Investment Court System) em tratados com países extra-UE (como foi o caso do CETA, entre o Canadá e a UE, e nos acordos da UE com o Vietname, Singapura e México). Vários Estados encontram-se, pois, neste momento, a responder aos desafios e preocupações em torno do ISDS através de diferentes vias. Paralelamente, a UE promove, a nível multilateral, o estabelecimento do MIC (Multilateral Investment Court).
Devido a questões problemáticas, como falta de transparência, inconsistência das decisões arbitrais, conflitos de interesse ao nível dos árbitros, financiamento por terceiros, ou ainda abusos por parte de empresas “caixa de correio”, o ISDS encontra-se, desde Março de 2019, a ser objecto de um processo de reforma no âmbito da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (UNCITRAL, Grupo de Trabalho III).
Portugal tem actualmente 34 BITs que incluem ISDS. Alguns deles, nomeadamente com a Argentina (1994), a Tunísia (2002), o Paquistão (1995) e o Kuwait (2007), aproximam-se em breve do seu termo. Outros, nomeadamente com Cabo Verde (1990), o Chile (1995), a Sérvia (2009), a China (2005), a Guiné-Bissau (1991), a Coreia do Sul (1995) e o Uruguai (1997), podem ser denunciados a qualquer momento.
A TROCA – Plataforma por um Comércio Internacional Justo tem vindo há vários anos a acompanhar e a informar o público português acerca do mecanismo ISDS e, no contexto do acima apresentado, vem por este meio solicitar uma reunião que possibilite conhecer o posicionamento e as intenções do Governo Português a este respeito.
Saudações cidadãs,
Pela TROCA- Plataforma por um Comércio Internacional Justo,
Ana Moreno e Conceição Alpiarça