A legislação laboral inclui os níveis provincial e federal, e a carta dos direitos e liberdades também engloba esses dois níveis. No Canadá, a maioria dos trabalhadores é abrangida pelas cartas dos direitos provinciais. Os funcionários federais e das empresas do estado é que são abrangidos pelas competências federais, como dos transportes públicos, media, bancos e departamentos oficiais.
Mas os padrões provinciais são diferentes entre si, como salários mínimos, leis laborais, contratos colectivos, etc. Em geral o Québec é onde há mais força e Alberta é mais fraca.
Em teoria existe o direito de associação e de negociação colectiva, mas na prática, o assunto é bem mais complicado.
Nas últimas três décadas, os canadianos têm assistido a uma séria erosão de alguns direitos fundamentais como o de se organizarem em sindicatos e de aderir a acordos colectivos. Praticamente todas as regiões do Canadá têm experimentado a violação do direito à contratação colectiva (e à greve também). Os governos provinciais e federal têm aprovado desde 1982 cerca de 218 decretos sobre a restrição e/ou suspensão do direito à contratação colectiva. Muitas restrições também têm sido colocadas ao direito à organização sindical e muitos acordos colectivos têm sido eliminados. A própria negociação salarial e de benefícios sociais também tem sido impedida. Muitas propostas dos empregadores têm sido legalmente impostas aos trabalhadores e o direito à greve removido. Este fenómeno tem atingido tanto o sector público como o privado.
Em anos recentes tem havido grandes alterações na frequência e severidade das “leis de regresso ao trabalho”…. Nas últimas três décadas, o governo federal aprovou 19 leis de regresso ao trabalho e os governos provinciais 71. A maior parte desta legislação não só força os trabalhadores a regressar ao trabalho, mas ainda impõe arbitrariamente acordos laborais aos grevistas.
A partir dos anos 80, tem sido vulgar a suspensão do direito à contratação colectiva, sobretudo no sector público. Esse direito foi conseguido pelos trabalhadores ao longo dos anos 60 e 70. Nas décadas seguintes, a maioria dos trabalhadores do sector público viu o seu direito à contratação colectiva ser suspenso por períodos entre 3 a 10 anos, conforme os casos.
Já houve mais de 50 decretos aprovados pelo governo federal e provinciais que suspenderam acordos colectivos….
Desde 1982, já houve 78 ocasiões em que leis federais e provinciais foram modificadas para restringir a capacidade de os sindicatos organizarem e discutirem acordos colectivos. 9 decretos passaram a negar de facto o direito de certas categorias de trabalhadores a aderir a sindicatos e 8 outros decretos restringem o processo de certificação no sentido de impedir o movimento laboral de organizar os trabalhadores não sindicalizados. 61 outros decretos tanto federais como provinciais restringem as regras e o alcance de contratações colectivas, proíbem o direito à greve e limitam os mecanismos para resolver disputas, bem como alargam a capacidade dos governos e empregadores para interferir em assuntos internos dos sindicatos.
No total já existem 218 diplomas legais que restringem ou proíbem os mais elementares direitos laborais, como os diferendos elegíveis para arbitrariação, contratação colectiva, congelamento salarial, aderência a sindicatos, imposição do regresso ao trabalho aos grevistas, etc.
Muitas instâncias laborais e milhares de trabalhadores estão a criar o “Workers Bill of Rights”, uma espécie de constituição geral dos direitos laborais, já desde 2006.
Um sumário destas leis restritivas pode ser encontrado em “Restrictive Laws” na Canadian Foundation for Labour Rights.
Diversas sentenças de tribunais têm considerado ilegais e/ou inconstitucionais algumas destas leis restritivas dos direitos laborais.
As queixas do movimento laboral canadiano junto do Comité da Liberdade de Associação da International Labour Organization (ILO) têm atingido os piores níveis de entre os 183 estados membros desta organização. Os sindicatos canadianos entraram com mais queixas do que qualquer outro movimento laboral em outros países.
Nota:
Esta deplorável situação no Canadá não pode deixar de ter repercussões na situação europeia em geral e portuguesa em particular, se o tratado CETA entre a UE e aquele país entrar em vigor.
O nível de degradação dos direitos laborais na Europa e em Portugal vai necessariamente acelerar por via do confronto entre as duas economias, uma vez que as empresas que não quiserem alinhar pelos padrões mais liberais que são norma do outro lado do Atlântico, terão graves problemas de sobrevivência face à concorrência acrescida. Muitas terão certamente de fechar portas.
O mesmo sucedeu já com o tratado NAFTA que originou uma verdadeira devastação particularmente nas condições laborais, queda de salários, precariedade, esmagamento de direitos, encerramento de empresas e despedimentos em massa, sobretudo no México, mas também nos EUA.
É precisamente esse nível de barbárie laboral que os interesses corporativos querem exportar para a Europa, com a preciosa colaboração dos governos simpatizantes e dos burocratas de Bruxelas, onde se destacam o presidente Juncker, o presidente do Parlamento Martin Schultz e a Comissária do Comércio, Cecilia Malmström, entre outros.
E este cenário é-nos apresentado sob as roupagens idílicas do desenvolvimento do comércio, criação de muitos postos de trabalho e subida dos rendimentos.
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Sujata Dey, Council of Canadians, 24/09/2016
http://labourrights.ca/issues/restrictive-labour-laws-canada
Tradução e adaptação de Manuel Fernandes