As recentes negociações comerciais entre a União Europeia e os Estados Unidos da América resultaram num “acordo político” que levanta sérias preocupações quanto à sua justiça e equidade. Embora não exista ainda um tratado formal – apenas uma declaração simbólica com uma fraca base jurídica -, as primeiras análises sugerem um resultado profundamente desequilibrado, favorecendo fortemente os interesses estado-unidenses.
Como Francisco Seixas da Costa observou com clareza no seu post do facebook “TRUMP 15 – EUROPA 0”, este acordo parece menos uma negociação e mais um “diktat” – uma imposição forçada, em vez de um acordo mutuamente benéfico. As concessões feitas pela UE vão além dos simples ajustes tarifários; incluem um aumento do investimento europeu nos EUA de 600 mil milhões de dólares (quando ainda recentemente o relatório Draghi alertou para a necessidade de aumentar consideravelmente o investimento no continente, apontando as dificuldades de atingir os montantes necessários), bem como compromissos para comprar 750 mil milhões de dólares em gás, petróleo e “uma quantidade significativa” de equipamento militar estado-unidense. Isto alinha-se com o recente aumento nos gastos militares impulsionado pela pressão de Washington, desviando recursos de indústrias europeias e minando os esforços rumo a uma verdadeira autonomia estratégica do continente. A Europa estará, dessa forma, a entregar a sua influência e dependência energética aos EUA (como antes fizera com a Rússia). Isto é ainda mais grave quando consideramos que estes tipos de despesa não são uma competência comunitária. Os compromissos de compras de gás e petróleo também traem os objectivos climáticos da UE pois representam um retrocesso dramático no caminho para as energias alternativas que o Pacto Ecológico tinha definido.
A TROCA considera que este acordo é particularmente preocupante dada as suas implicações para os princípios da justiça comercial e social. A disposição da UE em priorizar estas compras, levanta questões sobre o seu compromisso com práticas comerciais justas e a saúde económica e política a longo prazo das comunidades europeias. O foco nas importações militares, impulsionado por pressão externa, desvia ainda mais recursos de áreas cruciais como programas sociais e desenvolvimento sustentável. E a cedência deste “acordo” representa uma vitória simbólica e estratégica para a linha política de Trump: ao optar por proteger os interesses de algumas multinacionais em vez de utilizar a alegada “bazuca comercial” da UE, Bruxelas abre caminho para que a extrema-direita exponha a fraqueza da Europa e eleve Trump a modelo de força e eficácia — um cenário sombrio que se concretiza pela própria impotência da União.
A TROCA tem alertado para a conclusão de negociações precipitadas, sem uma adequada consulta de todas as partes interessadas. A assimetria criada, em que produtos europeus têm uma tarifa de 15% (ou até 50% em alguns casos), enquanto que produtos estado-unidenses, sem os mesmos padrões de sustentabilidade, têm tarifa 0%, ilustra na perfeição o significado de comércio internacional injusto. E até a Organização Mundial do Comércio (OMC) afirma que os termos do “acordo” violam as suas regras (tarifas discriminatórias, falta de reciprocidade).
A aprovação deste acordo pode pôr em causa, de maneira irresponsável, a credibilidade das instituições europeias, incentivando extremismos perigosos. Na TROCA, continuaremos a defender políticas comerciais que priorizem as necessidades das pessoas sobre o lucro, promovam a concorrência justa e se alinhem com o interesse das populações. Exortamos os decisores políticos a rejeitarem este tipo de acordos e, em vez disso, a perseguirem estratégias que promovam uma cooperação genuína e um benefício mútuo – não acordos ditados por interesses poderosos.