Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
Em fevereiro de 2016, o atual governo decidiu cancelar os acordos de subconcessão da gestão da rede do Metropolitano de Lisboa e da rede da CARRIS. Por um lado, a reversão de privatizações ou subconcessões encapotadas e a proibição de novas privatizações faziam parte do acordo efetuado entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista. Por outro lado, o serviço público de transportes públicos de Lisboa estava gravemente posto em causa.
Importa perceber que a subconcessão à Avanza (subsidiária espanhola da ADO-Grupo Autobuses de Oriente) ocorreu em junho de 2015, sob orientação do anterior governo PSD/CDS, após anos de desinvestimento na qualidade dos serviços, deterioração das condições de trabalho e de corte de carreiras, horários e carruagens do metropolitano.
Em comunicado de imprensa, a ADO refere que tem “demonstrado boa-fé e lealdade institucional e que continuará a agir em defesa dos seus interesses em face do que considera serem atos arbitrários do governo português, que constituem uma grave violação das suas obrigações internacionais, e que prejudicam o seu investimento.”
A ameaça de pedido de indemnização resulta do enquadramento legal dos tratados de investimento, nomeadamente do seu mecanismo de resolução de litígios entre investidor e Estado (ISDS, Investor to State Dispute Settlement) que decorre à margem dos tribunais nacionais, através da criação extraordinária de um júri privado de três juristas, contratados pelas partes. O valor anunciado de pedido de indemnização é de 42 milhões de euros, o equivalente a 4,5% do Orçamento de Estado para 2016 para o setor dos transportes ou 28,3% do orçamento do Metropolitano de Lisboa para 2016.
De relembrar que, até à reversão da subconcessão, a ADO ainda não tinha feito qualquer investimento. Ora, o pedido de indemnização surge porque na linguagem do mecanismo internacional de proteção de investimento é considerado “investimento” os lucros que a empresa esperava vir a obter no futuro. Portanto, o Estado português pode estar perante um processo e pedido de indemnização de 42 milhões de euros por lucros que a ADO não obteve, mas esperava obter.
Estes conflitos entre empresas e Estados não são novos, mas têm vindo a acentuar-se nos últimos anos, tal como é verificado pelo relatório das Nações Unidas“United Nations Conference
on Trade and Development (2016) – Investor-state Dispute Settlement: Review os developments in 2015, IIA Issues Note nº2, June 2016”.
Este mecanismo tem vindo a ser alterado e está inscrito nos tratados mais recentes, nomeadamente no CETA, entretanto aprovado pelo Conselho Europeu, e no TTIP ainda em negociações. O Bloco de Esquerda tem alertado para os perigos destes mecanismos, com especial enfoque para os mecanismos de resolução de conflitos, pois retira poder de decisão democrática dos Estados perante multinacionais que invistam no seu país.
A reversão das subconcessões dos transportes públicos de Lisboa era essencial para o serviço público e para os cidadãos, além de ser uma decisão legítima tomada por um governo
democraticamente eleito.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério do Planeamento e Infraestruturas, as seguintes perguntas:
1. Qual o ponto de situação do pedido de indemnização da ADO ao governo de Portugal?
2. Perante os processos antecedentes semelhantes, que medidas pretende o governo tomar para evitar uma decisão de pagamento à empresa?
Palácio de São Bento, quinta-feira, 10 de Novembro de 2016
Deputado(a)s
HEITOR DE SOUSA(BE)
ISABEL PIRES(BE)
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Nos termos do Despacho n.º 1/XIII, de 29 de outubro de 2015, do Presidente da Assembleia da República, publicado no DAR, II S-E, n.º 1, de 30 de outubro
de 2015, a competência para dar seguimento aos requerimentos e perguntas dos Deputados, ao abrigo do artigo 4.º do RAR, está delegada nos Vice-
Presidentes da Assembleia da República.






