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Cresce a oposição ao Pacto Regional = RCEP

Cresce a oposição ao Pacto Regional = RCEP

Cresce a oposição ao Pacto Regional = RCEP

Menos conhecido do que o notório Trans-Pacífico, o Regional Comprehensive Economic Partnership (RCEP) está a gerar crescente oposição devido às suas disposições muito similares.

Este pacto regional actualmente a ser negociado em segredo, começou a chamar a atenção das organizações da sociedade civil após uma fuga de informação bem ilustrativa dos seus potenciais impactos negativos na saúde, agricultura, sociedade e economia dos estados visados .

O RCEP foi inicialmente encarado como uma antídoto ao altamente controverso TPP, uma vez que um certo nº de países envolvidos num também estava envolvido no outro e tinham reservas relativamente ao segundo. Mas os factos demonstram que, sobretudo a Coreia do Sul e o Japão estão a pressionar a inclusão de normas principalmente a respeito da propriedade intelectual que visam harmonizar os dois tratados, fazendo do RCEP quase uma cópia do TPP.

As negociações do RCEP foram lançadas em Nov. de 2012 e incluem 10 países da Associação das Nações do Sudoeste Asiático (ASEAN) junto com a Austrália, N:Zelândia, China, Coreia do Sul, Japão e Índia (….)

Nos últimos meses, fugas de informação sobre as propostas do Japão e da Coreia proporcionam uma ideia sobre o que está em cima da mesa (….)

Na Índia, grupos de agricultores, sindicatos e diversas associações da sociedade civil têm organizado protestos, manifestações e feito exigências ao governo para parar com as negociações devido aos perigos potenciais do acordo.

Afirmam que o RCEP impõe a liberalização dos mercados e a adopção de normas que ultrapassam em muito os tratados já existentes e que ameaçam as indústrias domésticas, prejudicam a agricultura e dificultam o acesso aos medicamentos. Claro que estas preocupações também se aplicam a outros estados e não são específicas da Índia.

As disposições sobre propriedade intelectual (IP) existentes nos documentos japoneses, objecto da fuga de informação e tornados públicos em Fev. de 2015, propõem o alargamento dos monopólios e obrigações já existentes na OMC e na legislação internacional sobre IP. Um conjunto de académicos sumarizou essas exigências:

– Alargamento e extensão dos monopólios das patentes, sobretudo dos medicamentos;

– Extensão das restrições ao uso de dados clínicos que suportam a aprovação de genéricos;

– Possibilidade da apreensão de genéricos em trânsito, até para os suspeitos de infringir as leis de IP do país onde transitam;

Os outros documentos também objecto de fuga de informação são sul-coreanos e foram divulgados em junho de 2015. Também se referem a privilégios adicionais para a indústria farmacêutica, incluindo extensão de patentes, arresto de medicamentos em trânsito suspeitos de infrigirem a IP e previsão de indemnizações de acordo com os critérios do detentor das patentes.

Uma vez que a Índia e a China são os principais fornecedores de genéricos aos países pobres, estas propostas significam o adiamento da entrada no mercado de mais genéricos, com impacto global considerável. As empresas indianas têm fornecido genéricos a muitos países pobres porque as suas leis sobre IP procuram equilibrar os direitos privados e os públicos. Por exemplo, não permite a concessão de patentes a novas formas ou novos usos de substâncias já conhecidas, prática comum à indústria farmacêutica conhecida como “evergreening” (rejuvenescimento) das patentes. Todas estas salvaguardas se perderiam se a Índia e outros países aceitarem as propostas do Japão e da Coreia.

Em termos de copyright, as propostas coreanas são ainda piores que as japonesas na opinião do advogado da Elecronic Frontier Foundation, Jeremy Malcolm e incluem, entre outras, as seguintes disposições:

– Direitos de copyright por mais de 70 anos;

– Proibição de cópias temporárias em formato electrónico;

– Proibição de retransmissão via net de programas que impeçam o livre uso de materiais do domínio público;

– Indemnizações inflacionadas por infracção de patentes e cálculo de danos;

– Sanções penais por infracções comerciais ao copyright e leis sobre marcas registadas, mesmo que o infractor não obtenha lucros com isso;

– Remuneração dos artistas de rádio que excedem as leis americanas;

– Autorização de processos legais expeditos para os detentores dos direitos obterem informação sobre os infractores, sem necessidade de ordem judicial.

Outras áreas de preocupação do RCEP também terão impacto negativo na agricultura e nas industrias manufactureiras. As organizações de agricultores indianos, nomeadamente a All Indian Peasants Union, têm erguido a sua voz com receio de que o RCEP aumente a importação de produtos agrícolas, como aves, ameaçando assim a vida dos agricultores (…).

As fugas de informação também indicam que as propostas terão implicações sérias na legislação doméstica sobre protecção das variedades de sementes e direitos dos agricultores.

Segundo Shalini Buhtani, investigador e analista político, as propostas exigem que todos os membros do RCEP acedam ou ratifiquem cerca de uma dúzia de acordos internacionais sobre IP, incluindo a Convention for the Protection of New Varieties of Plants (UPOV) que dá primazia aos grandes agrobusiness corporativos e restringe as actividades dos agricultores comuns. Torna-se claro que o Japão e a Coreia estão a exigir mais protecção IP sobre as suas variedades de plantas relativamente ao que os países estão obrigados com as regras da OMC.

O RCEP vai aumentar a pressão para a Índia e mais países se juntarem ao UPOV, coisa que a Índia nunca quis fazer.

Do lado do emprego, este tratado não irá melhorar a situação, tal como os outros trados no passado também não o fizeram, declarou Dharmendra Kumar do FDI- Watch.

Amitava Guha, do Centre of Indian Trade Unions contou ao Business World que muitos dos países RCEP possuem indústrias bastante avançadas e a eliminação dos diretos alfandegários sobre produtos industriais irá intensificar a competição e reduzir os custos de produção. Tal vai pressionar a descida dos salários e dos direitos, lançar trabalhadores uns contra os outros, prejudicar o seu bem-estar, impedi-los de aceder a condições decentes ou de se organizarem colectivamente.

A resistência das indústrias domésticas ao RCEP resultou no facto de o governo indiano ser obrigado a propor um plano de aproximação gradual para o desmantelamento das barreiras alfandegárias.

Recentemente, um grupo de peritos da ONU exprimiu sérias preocupações sobre os impactos negativos que os tratados de comércio e investimento terão sobre os direitos humanos e também sobre a natureza sigilosa das negociações e o seu perigo potencial. Recomendam, portanto, que todas as negociações (…) sejam conduzidas com transparência e com consultas e participação permanente de todas as entidades relevantes, incluindo sindicatos, associações de consumidores, ambientalistas e profissionais da saúde.

Esses especialistas da ONU também exigem salvaguardas que assegurem a total protecção dos direitos humanos.

Third World Resurgence, nº 298/299, Junho/Julho de 2015-09-01

Fonte:

Malcolm J, “Meet RCEP, A Trade Agreement in Asia That’s Even Worse Than TPP or Acta”, Electronic Frontier Foundation, 4/ June/ 2015

https://www.eff.org/deeplinks/2015/06/just-when-you-thought-no-trade-agreement-could-be-worse-tpp-meet-rcep

Chee Yoke Heong, investigador da Third World Network, Bilaterals.org, 01/09/2015

www.bilaterals.org/?opposition–mounts-against-regional&lang=en

Tradução e adaptação de José Oliveira