Nesta data tem início uma nova ronda negocial em Genebra na OMC sobre o acordo secreto para limitar a supervisão pública a respeito da economia dos serviços…isto na altura em que o Wikileaks acaba de publicar nova fuga de informação sobre alguns anexos essenciais do TISA, sobretudo acerca do modo como os governos poderão regular empresas estatais, serviços profissionais e novas disposições aplicáveis a todos os serviços. Outros textos têm também sido alvo de fugas de informação sobre um tratado que estipula permanecer secreto vários anos após a sua conclusão, mesmo se for rejeitado. Entre estas, temos normas sobre serviços financeiros, comércio on line, movimentos de pessoas, telecomunicações e transparência… Aparentemente são propostas americanas.
As novas disposições do anexo restringem os programas de estimulação ao emprego por parte dos governos relativamente a fornecedores de serviços estrangeiros. Estas propostas são mais extremas do que as que já existem em outros tratados e vão tornar muito difícil aos governos TISA regular efectivamente essas companhias, incluindo o sector financeiro. Além disso, vão restringir a capacidade dos países em desenvolvimento para regularem os investimentos estrangeiros de modo a promover o desenvolvimento do mesmo modo que já fizeram os países TISA mais desenvolvidos, isto segundo uma extensa análise feita por Sanya Reid Smith, consultora da Third World Network em Genebra (ver link acima).
O Departamento do Tesouro e o Office of the US Trade Representative revelaram recentemente um plano para ir além do TTIP em termos de exigências para serviços financeiros na proposta do TISA, sempre no sentido de agradar à indústria dos grandes bancos, corporações e aos membros do Congresso que os apoiam….
Dizem que vão contratar trabalhadores locais e a população vai ganhar know-how, mas acontece o contrário. Com o TISA, a contratação de trabalhadores locais será proibida e as transferências de tecnologia também…
(Ou seja, quer impedir-se o desenvolvimento dos países mais atrasados e acelerar o dos mais desenvolvidos)
Historicamente os EUA, Japão e muitos países europeus exigiam às companhias estrangeiras que se queriam estabelecer que contratassem trabalhadores domésticos. Essa ferramenta de gestão de pessoal é formalmente proibida no texto. Trata-se de subir a escada e depois atirá-la fora (para que mais ninguém suba).
O TISA não procura a participação de companhias estrangeiras no mercado de um país nem procura que os bancos apoiem os mais pobres ou que as grandes companhias de telecomunicações vão fornecer ligações a sítios remotos, áreas rurais pobres, etc, ou ainda que as companhias de electricidade assegurem o fornecimento a todos.
Em vez disso, o TISA está concebido para limitar o modo como os governos podem controlar as companhias estrangeiras em benefício das populações. Nos EUA já há muitos problemas com o serviço a clientes da Comcast, Verizon e outras. Imaginemos como seria possível responsabilizar uma companhia de telecomunicações gigante que nem sequer precisa de ter presença local, como estipula o texto do TISA?
O Anexo dos serviços profissionais restringe o modo como os governos e as associações profissionais regulam o acesso aos mercados, fornecimentos além-fronteiras, exigências sobre presença local, limitações ao capital estrangeiro, licenciamento para fornecedores de serviços estrangeiros, engenharia, planeamento urbano, arquitectura paisagística, testagem técnica, análise, serviços legais, consultoria em engenharia e ciência, serviços veterinários, serviços educativos privados e engenharia da construção.
Segundo a professora Jane Kesley da faculdade de direito da Universidade de Auckland:
“A proposta americana para as empresas estatais sob o TISA adopta alguns aspectos do TPP como parte da estratégia para criar novas regras globais através do triunvirato TPP, TTIP, TISA. A proposta vai forçar as empresas estatais a operar como sendo privadas. Não obriga apenas os governos a privatizar, mas remove a lógica para manter as empresas como públicas, criando condições encobertas para a privatização real…. Negociações obrigatórias serão lançadas se algum país com alta concentração de empresas estatais quiser entrar. Claro que a China é o alvo principal…. Há uma mensagem muito concreta. Ou adoptam o modelo americano ou ficam do lado de fora”.
As alterações ao comércio electrónico continuam a ser feitas sem qualquer relação com os utentes afectados, sobretudo a comunidade de utentes habituais e inovadores…. Os documentos mostram bem o modo como o TISA responde aos maiores desejos dos grandes lobbies corporativos para desregular os serviços, muito para lá das regras da OMC.
Os documentos expõem a ambição do TISA para limitar ainda mais a capacidade regulatória dos governos eleitos, impondo limites às aquisições públicas, licenças de imigração, certificações profissionais e operações de negócios, para já nem falar do próprio processo regulatório.
Esta fuga de informação vem na sequência de várias outras:
– Junho de 2014: Serviços financeiros
– Dezembro de 2014: Circulação de dados além-fronteiras, transferências tecnológicas e neutralidade na NET.
– Fevereiro de 2015: Turismo e saúde.
– Junho de 2015: Publicação massiva de 17 documentos, incluindo anexos sobre transportes aéreos e marítimos, entregas, comércio electrónico, telecomunicações, serviços financeiros, serviços profissionais, funções dos governos sobre regulação doméstica e transparência.
– Julho de 2015: Versão actualizada sobre os textos centrais do tratado.
– Dezembro de 2015: Energia e serviços ambientais. É aqui evidente como o TISA vai constranger a capacidade dos estados para implementar os acordos da Cimeira de Paris sobre o Clima.
A sociedade civil tem avisado que as negociações do TISA seguem de perto a agenda corporativa que visa usar os acordos de comércio para subjugar os países a um projecto de liberalização extrema e de desregulação para assegurar ainda mais lucros às custas do factor trabalho, dos agricultores, consumidores e ambiente.
O actual acordo em preparação é o resultado directo das exigências sistemáticas das corporações internacionais relativamente à banca, seguros, energia, telecomunicações, transportes, água e outros serviços.
Tudo isto é feito através de lobbies e grupos como a US Coalition of Services Industries (USCSI) e o European Services Forum (ESF).
O TISA está a ser negociado entre 50 países (23 da UE) com o objectivo de alargar a cobertura e âmbito do GATS (General Agreement on Trade in Services) no seio da OMC…
No ano passado, o Uruguai abandonou as negociações na sequência de grandes protestos públicos quando se soube das fugas de informação…. O Paraguai fez o mesmo pouco depois.
A Confederação Sindical Global Public Services International publicou o 1º relatório sobre o TISA em Março de 2014: “TISA vs Public Services”. Esta organização junto com outras, publicou também em Setembro de 2014 o “Really Godd Friends of Services Agreement”.
Informações adicionais sobre o TISA podem ser encontradas no site da OWINFS (Our World is not for sale)
Deborah Jones trabalha para a OWINFS e é directora de programas internacionais do Center for Economic and Policy Research (CEPR).
(Não confundir com a agência inglesa CEPR que tem feito estudos de impacto do TTIP)
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Huffington Post, Deborah Jones, 30/05/2016, Bilaterals
Bilaterals.org/?the-leaks-go-on-before-another &lang=en
https://wikileaks.org/tisa/New-Provisions/anlysis/page-1.html
Tradução e adaptação de Manuel Fernandes






