Reposta ao artigo seguinte : http://www.ionline.pt/artigos/iOpiniao/impacto-ttip-portugal
O artigo do I baseia-se, como é referido no texto, apenas no estudo da agência londrina CEPR encomendado pelo governo português.
Olhemos mais detidamente para esta instituição. Uma consulta ao respectivo site mostra bem quem são os seus patrocinadores: algumas multinacionais, alguns grandes bancos e outros trusts (ligações estabelecidas em base de confiança) bem conhecidos do mundo corporativo. Como imagem de agência independente não precisamos ir mais longe.
Mas, outros aspectos não menos importantes devem merecer a nossa atenção. A mesma agência, exactamente a mesma, foi também contratada pela UE para realizar um estudo de impacto do TTIP sobre a economia do velho continente e, aí, as conclusões são, na maior parte dos casos bastante diferentes e até opostas às que surgem no documento citado pelo I. Temos portanto de concluir que a exactidão dita científica de ambos os estudos fica, no mínimo, seriamente abalada.
Como se isto não bastasse, existem outros aspectos não menos controversos. Os cenários construídos pelo CEPR e outras instituições análogas baseiam-se num modelo matemático-económico de base, também utilizado pelo FMI e pelo Banco Mundial conhecido pela sigla CGE, (modelo do Equilíbrio Geral) que postula, entre outros pressupostos, que o impacto de tratados como este, bem como a dinâmica dos mercados tende sempre para o pleno emprego. No dizer destes especialistas, os empregos perdidos pela falência de empresas incapazes de enfrentar a concorrência são recuperados na totalidade pelas empresas que se expandem devido à mesma concorrência. Outro dos curiosos pressupostos de base deste modelo é o de que os orçamentos dos estados são sempre equilibrados, com as despesas a equivaler às receitas. É assim estribados em concepções tão longe da realidade objectiva que são construídos os cenários paradisíacos, apresentados aos povos e às empresas, no sentido de os levar a aceitar o inaceitável.
Mas, ainda não é tudo. Mesmo aceitando hipoteticamente que possa existir alguma aderência à realidade nesses eventuais cenários, permanece um ponto incontornável que nunca é referido de modo responsável pelos apoiantes do Tratado. Nenhum desses estudos encara seriamente o problema dos custos da pretendida harmonização. Por outras palavras. Avança-se como o número mirífico de 40.500 novos empregos no curto prazo, mas nem uma palavra sobre quanto isso iria custar quer em termos de empregos destruídos, quer em receitas perdidas pelo estado, quer em custos sociais, quer em readaptação do tecido produtivo, formação profissional, subsídios de desemprego e outras despesas associadas. Normalmente também não se dá importância ao facto de a maioria dos novos empregos a criar serem mais mal pagos e incluírem menos direitos do que os que são destruídos. Um simples exercício de lógica permite perceber que, estando as empresas e bancos portugueses altamente descapitalizados, e exigindo a criação desses milhares de empregos o investimento de avultados montantes de capital fixo e variável, teríamos de ir buscá-lo aos grandes bancos internacionais. Ora, é sabido que os donos do dinheiro preferem de longe investir muito mais na economia especulativa do que na produção de bens ou serviços (mais nestes do que naqueles), devido aos enormes lucros imediatos que essas actividades lhes proporcionam. Sendo assim, não vemos como enquadrar os cenários que nos apresentam, numa perspectiva relativamente realista, ou sequer provável.
Por outro lado, um especialista americano que tem trabalhado para várias agências da ONU, Jeronym Capaldo, consciente das limitações e distorções inerentes ao modelo CGE, criou um outro modelo económico-matemático inteiramente diferente, baseado em pressupostos mais conformes com a realidade, tendo chegado a conclusões dramaticamente diferentes. Segundo este investigador, mesmo as grandes economias europeias iriam sofrer perdas avultadas em termos de queda do PIB e quebra da taxa de emprego, por efeito da aplicação do TTIP.
Outro ponto a que não se tem dado a devida atenção é o facto de a quase totalidade das previsões, mesmo as mais optimistas, avançarem com uma queda substancial do comércio dentro da própria UE e desta com países terceiros como consequência do Tratado. Ora, sendo a maioria das exportações portuguesas destinadas ao espaço europeu, mais difícil se torna aceitar a probabilidade de Portugal ter muito a ganhar com a Parceria Transatlântica. Haverá certamente como em tudo, perdedores e ganhadores com estes acordos, mas pelo exposto, não nos parece que a maioria dos portugueses esteja entre os segundos.
José Oliveira, Plataforma Não aoTratadoTransatlântico.






