Mais uma vez, um tribunal de arbitragem privada passa por cima da decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia segundo a qual o Tratado da Carta da Energia não é compatível com a legislação da UE e como tal, não é aplicável a litígios entre Países-Membros da UE.
Conforme relata a notícia infra, a Espanha deverá pagar indemnização pelos cortes de subsídios às energias renováveis ocorridos entre 2012 e 2014.
Já Portugal, que também cortou subsídios, chegou a um arranjo com as energéticas por forma a indemnizá-las por via das tarifas de acesso à rede e outras, de modo que os contribuintes viram aumentadas as suas contas de electricidade para compensar “lucros futuros” das empresas de energia. Todo este processo caracteriza-se por uma inaceitável falta de transparência.
“A 14 de Setembro de 2022, o tribunal de arbitragem de investimento entre Mathias Kruck e outros v. Espanha emitiu a sua “Decisão sobre jurisdição, responsabilidade e quantum”, rejeitando o argumento da Espanha sobre a incompatibilidade do Tratado da Carta da Energia (TCE) com o direito da União Europeia.
O tribunal arbitral dos investidores alemães Mathias Kruck e outros, constituído pelo britânico Vaughan Lowe (presidente) e os australianos Michael C. Pryles (nomeado pelos requerentes) e Zachary Douglas (nomeado pelo requerido) decidiram, com este último a discordar em parte, que a Espanha deve indemnizar os requerentes, numa arbitragem relacionada com subsídios às energias renováveis, alterados por regulamento entre 2012 e 2014.
Os requerentes apresentaram a queixa para arbitragem de investimento perante o Centro Internacional de Resolução de Litígios de Investimento (ICSID) em Junho de 2015, invocando o TCE e ao abrigo das regras de arbitragem da Convenção ICSID.
A disputa diz respeito ao investimento dos requerentes em instalações de energia fotovoltaica entre 1994 e 2008, apoiado por legislação de incentivo às energias renováveis para atrair investimento estrangeiro. As alterações regulamentares introduzidas em Espanha a partir de 2010 afectaram os incentivos aplicáveis e o regime financeiro dos investimentos, reduzindo os lucros e as receitas.
Na sua decisão, o tribunal rejeita a objecção, baseada na relação entre o Tratado da Carta da Energia e a legislação da UE, e declara que procederá à determinação das restantes questões na sentença.
A posição da Espanha sobre esta questão baseou-se, acima de tudo, no facto de a legislação da UE não permitir a arbitragem intra-UE e, por conseguinte, não ser aplicável a este litígio e ao conflito existente com o TCE.”