Um dos assuntos de que não vais ouvir os candidatos falar na campanha são as políticas relativas ao comércio internacional. Não dá votos.
Alguns dirão que “falar de política internacional não é para eleições nacionais”. No entanto, as eleições para a Assembleia da República são absolutamente cruciais para se conseguir uma política de comércio mais justa, sustentável, e onde o interesse público e direitos humanos sejam acautelados. Afinal de contas, é na assembleia que a legislação nacional relacionada com o tema é aprovada, muitos tratados internacionais são ratificados, e é o primeiro-ministro e o seu gabinete que nos representa no Conselho Europeu e instituições associadas.
No início de Julho, a TROCA enviou algumas propostas do que considera serem actualmente as preocupações cidadãs mais prementes para um comércio internacional mais justo e sustentável a todos os partidos que se apresentaram a estas eleições.
Estas propostas buscam: transparência e abertura à sociedade civil nas negociações dos acordos de comércio e investimento; tendência para os padrões de protecção legislativa mais elevada no contexto da harmonização regulatória; impedimento de “dumping” ambiental e social e contabilização das externalidades ambientais no comércio internacional; eliminação/rejeição de mecanismos de resolução de litígios discriminatórios e desajustados (ex.:ISDS e ICS, MIC); legislação nacional e acordo vinculativo da ONU que combata a impunidade da empresas multinacionais na violação dos Direitos Humanos ou destruição ambiental.
A TROCA foi ler os programas para verificar o impacto destes no comércio internacional.
Nenhum dos programas abordou todas as propostas feitas. Segue-se, por ordem alfabética do nome dos respectivos partidos, uma selecção de propostas relacionadas com o comércio internacional e as nossas preocupações, no respectivo contexto ideológico.
O BE defende a definição de padrões de protecção laboral, social e ambiental em todo o espaço europeu, que seriam impostos a quaisquer acordos comerciais internacionais, travando a corrida para o fundo nos direitos e sustentabilidade. O BE demarca-se do governo na aceitação durante a anterior legislatura de acordos comerciais internacionais que acarretam perniciosas consequências sociais e ambientais para a sociedade portuguesa.
A CDU (PCP e PEV) rejeita os acordos comerciais internacionais (CETA, TTIP, JEFTA), devido às ameaças identificadas ao emprego, empresas portuguesas, e graves impactos ambientais.
Tal eliminaria os mecanismos arbitrais associados (ISDS, ICS, MIC), já várias vezes denunciados por ambos os partidos.
O LIVRE apoia que qualquer novo tratado ou alteração substancial dos tratados existentes seja referendado. Rejeita o ISDS, o sistema de tribunais de investimento e qualquer tentativa de criar um tribunal multilateral de investimentos. Considera também importante incorporar nas trocas comerciais critérios apertados de cumprimento de direitos humanos, laborais e de protecção do ambiente. Luta pela efectivação do Tratado Vinculativo da ONU sobre Empresas Transnacionais e Direitos Humanos, propondo também a criação de um Tribunal Internacional de Direitos Humanos e de um Tribunal Internacional contra os Crimes Ambientais.
O Nós Cidadãos considera que as negociações internacionais no âmbito dos acordos multinacionais devem respeitar a dignidade da pessoa humana.
O PAN propõe novos índices de desenvolvimento que internalizem os custos ambientais, o custo justo das transacções comerciais e que garantam o respeito pelos direitos humanos. Pretende um reforço do comércio justo e sustentável com os países de Língua Portuguesa. Rejeita os acordos comerciais internacionais (CETA, Mercosul, TTIP, TISA, JEFTA), os quais pretendem que sejam alvo de um amplo debate na sociedade civil e sejam sujeitos a aprovação nos parlamentos nacionais. Também apoiam um Acordo Vinculativo da ONU sobre Empresas Transnacionais e Direitos Humanos eficaz na protecção do ambiente, dos consumidores e dos animais. Lutam pela existência de um Pacto Global para o ambiente.
Finalizada a análise de todos os programas eleitorais divulgados, verificámos que os restantes partidos não abordam as questões relacionadas com o comércio internacional e as nossas preocupações referidas acima.
A ausência do comércio internacional justo nos programas eleitorais, em particular dos programas dos grandes partidos, é consistente com o desconhecimento de um sector grande da nossa sociedade sobre esta problemática tão importante e com tanta influência nas suas vidas. Tal reforça a importância de campanhas como a “Direitos humanos primeiro! Justiça igual para todos!“ na divulgação e discussão deste assunto e na cimentação da sua relevância.