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O ISDS é um poderoso inimigo de quem vive do seu trabalho

O ISDS é um poderoso inimigo de quem vive do seu trabalho

O ISDS é um poderoso inimigo de quem vive do seu trabalho

O equilíbrio de forças na relações laborais tem ganho, nos últimos anos, um novo inimigo, um novo meio de limitação da progressividade das condições de trabalho, uma nova ferramenta de oposição à regulamentação laboral pelos Estados.

Este novo inimigo chama-se ISDS – Investment State Dispute Settlement (Resolução de litígios entre investidor e Estado), que não é mais do que um sistema de arbitragem para resolução de litígios com a particularidade de, por ser alternativo ao sistema judicial, permitir aos investidores afastar a aplicação das legislações nacionais.

Este sistema é a nova “prenda” que a União Europeia está a oferecer a empresas de outros Estados que estejam interessadas em investir, ou estabelecer relações comerciais, fazendo-a integrar os acordos de investimento e comércio que celebra com esses Estados.

E qual o impacto destes mecanismos no trabalho dentro da União Europeia?

Pois bem, existe uma dupla dimensão de implicações entre o ISDS e o trabalho: a dimensão negocial, enquanto manifestação do encontro de vontades entre empregadores e trabalhadores, e a dimensão regulamentar, como reflexo das estratégias públicas para o trabalho.

Na dimensão negocial, passando o trabalho a ser uma das esferas dos acordos de investimento e/ou comércio, os parceiros sociais e as estruturas representativas quer de trabalhadores, quer de empresas nacionais concorrentes das multinacionais que aqui investem, têm uma forte limitação na sua atuação.

O diálogo social e a negociação coletiva ficam reféns dos impactos que possam causar em investidores estrangeiros e da capacidade dos mesmos em recorrer ao ISDS para não lhes ser aplicada uma tabela salarial, uma limitação de horários, um regime mais restritivo da polivalência e por aí adiante…

A chantagem para os parceiros sociais que daí pode resultar fará com que, para não se limitar a posição no mercado e a política de recursos humanos das multinacionais que beneficiam do ISDS, nos setores onde estas atuam o diálogo social esteja enfraquecido, as reivindicações dos trabalhadores sejam menos relevantes para os resultados negociais e se caia na tentação da autoregulação. Aí chegados percebemos que as multinacionais com mais facilidade gerem os recursos humanos, controlam os mercados e se fazem prevalecer sobre as empresas de dimensão mais pequena, cujos níveis salariais serão necessariamente condicionados pela corda que têm em torno da garganta.

Já na dimensão regulamentar, os Estados, tendencialmente muito expostos a pressões lobbistas, pelos objetivos das políticas macroeconómicas, de exigência orçamental e de equilíbrio da balança comercial, têm demonstrado ao nível da União Europeia, nomeadamente Portugal, uma excessiva confiança nos acordos internacionais e no ISDS, ignorando – e até desprezando – os impactos negativos na sua própria autonomia.

Um Estado que pode ser alvo de uma queixa num centro de arbitragem que não aplica, por a tal não estar obrigado, a legislação nacional na resolução de um conflito de comércio ou investimento é um Estado cuja soberania é posta em causa. Um Estado que pode ser chantageado por forma a pagar compensações a empresas multinacionais por tomar decisões que beneficiam os trabalhadores e que, por esse facto, criam custos adicionais, ou limitam a gestão dos recursos humanos, é um Estado refém.

E se a sigla ISDS é quase uma completa desconhecida, já os exemplos dos efeitos aqui apresentados são cada vez mais frequentes e demonstram que as relações laborais são uma das dimensões dos acordos internacionais que os investidores não querem, nem vão deixar passar ao lado.

Considere-se, por exemplo, o caso dos investidores americanos da Noble Ventures que adquiriram uma empresa na Roménia recém privatizada e cujo processo de privatização acabou por se tornar mais caro do que estava estabelecido inicialmente devido às greves e manifestações dos dos trabalhadores. Esse facto levou a Noble Ventures a reclamar uma indemnização de 365 milhões de dólares pelos prejuízos no seu investimento causados pela contestação dos trabalhadores alegando que cabia ao estado ter feito mais para evitar a greve já que a mesma não teria cumprido todos os trâmites legais.

Ou, por outro lado, da Veolia Propreté, uma multinacional francesa que reclamou ao Egito uma compensação superior a 100 milhões de Euros, por quebra do acordo de investimento para gestão do lixo na cidade de Alexandria, nomeadamente através do aumento do salário mínimo.

Em ambos os casos, a legislação nacional foi colocada de lado nas pretensões empresariais e o Estado foi abordado como outorgante de um acordo, ignorando-se a dimensão social das políticas de investimento, mormente na sua dimensão laboral.

É essencial recusar o ISDS e defender o trabalho. Cada um pode começar por assinar e divulgar a petição europeia contra o ISDS.